segunda-feira, 12 de maio de 2008

Estilingada no raciocínio






Ponte octávio frias, se não me engano, estilingão no clamor popular, que às vezes também se engana. Liga a Av. Roberto marinho, antiga águas estragadas, intragáveis, a não sei onde. Bonita ponte, eu diria, não fosse meu atual bode da cidade do concreto, do automóvel, do subsídio concreto à atmosfera cinzenta que cimenta o espírito.


DUZENTOS E SETENTA E CINCO MILHÕES DE REAIS


foi o custo da obra. Qual minha objeção?


-proibido pedestres


-proibido bicicleta


NENHUM ÔNIBUS passa no local.




E aí, qual vai ser a da cidade? Quem se habilita?

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Viagem para Mukuru

Após estar tudo acertado que nos buscariam no Ytape, não tínhamos como subir do Aramirã até lá. Kumare resolveu dar um apoio, após meu pedido público na reunião, e Kavianã nos levou. O rio tava secando mas chegamos rápido.
Seremete estava aflito com minha viagem. “Você não vai chegar”, me disse super animadoramente. Como sempre, eu não ouvira os conselhos de Giu e Felipe sobre os rangos, e levara mais do que devia. Marityu fez um panakõ e arrumou a comida. “eu vô leva”, ele disse.
29/06
Saímos sem muita pressa, o primeiro acampamento não era tão distante do Ytape. Eu tava aflito, a expectativa da viagem era de que durasse oito dias. Oito dias... Fomos Jawaje´a, sua esposa, sua sogra, Marityu e sua esposa, e eu. Piriri, cacique do Mukuru, é sogro de Marityu, que ia aproveitar minha ida para lhe visitar. Apesar do trabalho que eu dou, a vantagem de ir comigo é desfrutar dos cartuchos e anzóis que trago.
A viagem tinha um gosto especial para a sogra de Marityu, cujo nome não me recordo. Ela fora casada com Atõ, Wajãpi de impressionante presença e carisma, liderança do Pypyiny que morrera alguns meses antes de nossa viagem. Ela vira para cá acompanhá-lo. Depois que ele faleceu, ficara uns três meses com o irmão saku, e agora retornava. Por todo o caminho até sua aldeia, Karavôvô, relembrara com saudade a companhia do marido, pelas trilhas pelas quais andaram juntos tantas vezes. Era uma saudade muito sincera, até eu que não o conheci bem senti saudade dele pela saudade dela.
29/06
Eu me canso mais de andar devagar, ainda mais carregando peso. Fui seguindo Jawaje´a e fomos à frente do grupo. Não vimos nenhum bicho neste dia, só rastros de anta e veado. Havia muita lama pelo caminho, que me entrava no sapato e machucava o pé sem meia. Jawaje´a andava muito rápido, e tive de segui-lo pois o resto do grupo estava muito atrás, eu não podia ficar sozinho por ali. Chegamos e me sentei jogado no chão. Andamos até uma 14 horas, era perto. Dei um mergulho num pedaço bonito dum rio pequeno, numa rara parte onde havia um posso descoberto de galhos. Jawaje´a matou uma cobra e pegou um trairão grande. Ele e Marityu fizeram um Tapiri pra gente, dava pra todos dormirem bem espaçados. O filho pequeno de marityu ia pendurado nas costas de sua mãe, então o apelidei de mochila (panakõ). Tinha 3 anos e me ensinava o nome das coisas em Wajãpi, o tempo todo, apontando. Disseram que a onça gritou de noite, eu não ouvi.
30/06
Fomos do Jav~ipytykwerã até o pé da montanha, a caminhada não foi nada que faça morrer. Dormimos num elevado entre dois rios, da minha rede eu via a água correndo. Era o Rio que vai até o Ytape, nascente do Pirima´yty. Água fria, sem trairão. Eu custei muito a dormir, as idéias se embaralhavam na minha cabeça. Tentei me concentrar, com a cabeça desfoca a chance de alguma merda acontecer é grande... Comemos soja com farinha, Jãjã (“irmã”) me contou sobre quando foi pro Inipuku, e como voltou de lá trazida pela FUNAI na época do contato.
1/7
A caminhada foi foda. Jawaje´a carregou minha mochila na subida da montanha, o que foi de grande ajuda. Minha perna tremia muito na trilha e minha lombar deu uma travada feia. Fomos do pé da montanha até o Pe´yryrywyry (“embaixo do Angelim”). Tomei diclofenaco, espero que minhas costas amanheçam bem. Jawaje´a e Marityu perguntam muito sobre São Paulo.
2/7
A idéia era que dormíssemos no Pypyiny, mas chegamos cedo e seguimos pro karavôvô. Entre os dois lugares minha perna bambeia muito. Eu dizia toda hora “não tem tá cansado, não tem tá cansado”, e jawaje´a ficou preocupado, achando que eu tava doido. Ouvimos um tiro, era alguém do Karavôvô caçando. Marityu atirou pra cima, eles vieram ao nosso encontro. Traziam um filhote de Cateto, acertaram sua mãe mas ela fugira. Vimos uma Sucuri muito grande descansando num igarapé, sua barriga tinha dois calombos. Cotia, disseram. Chegamos no Karavôvô e me receberam muito bem. Queriam conversar muito, mas eu só queria minha rede. Tomei um monte de casiri e esqueci a fome, ficando rápido meio porre. Dormi um sono muito profundo no Karavõvõ, embalado pelas cuias de casiri. Sonhei longe.

Continua...

Frangos assustados nas costas do tatu


Em diversas granjas espalhadas pelo interior do estado se criam frangos. São grandes estufas retangulares com tetos e paredes cobertas para isolar as galinhas das intempéries da natureza. Vários refeitórios redondos se distribuem em meio ao pátio de convivência, e nestes os frangotes se aglutinam degustando ração, rica em hormônios do crescimento para encurtar-lhes o sofrimento da vida e alargar a lucratividade do produtor. Sem parar, tendo os períodos noturnos reduzidos por luzes artificiais, as galinhas comem, ciscam. Não se pode fazer barulho brusco algum nestes celeiros modernos, pois de tanto comerem, as galinhas tem as veias do coração fragilizadas, e pequenos sustos interrompem-lhe a vida. Algumas vezes por dia um funcionário recolhe os defuntos das mais estressadas.
Uma parte dessa galinhada se consome como carne mesmo, assada na tv de cachorro, frita, ao gosto nosso de cada dia. Outra parte vai para sei lá o que e outra parte, a que me interessa aqui, é usada para se produzir Steak de frango: A CARNE MECANICAMENTE SEPARADA DE AVES. Tal pedaço é transformado em seiva de frango através de seu dilaceramento. Vira papa, suco gelatinoso-protéico com sangue e víscera. A essa papa se somam outras coisas desconhecidas, que engrossam a massa e aumentam o peso. Sendo a massa maleável, é prensada em bifes que lembram o formato original do filé integral: steaks. De consistência duvidosa, de gordura gelatinosa, de sabor variável.
Quando eu passava pela Rua Tuiutí, no Tatuapé (do tupi – costas do tatu), numa estufa de salgados descansavam de sua fabricação três steaks. Bonitos, pedi um. Esquentado nas microondas ficou ainda mais gelatinoso e estranho. Carne fabricada. Eu dei algumas mordidas e tive de desperdiçar, que é pecado, mas pecado original é a fabricação de steaks batavo. Outros são melhores.
Eu fui embora e dois steaks ficaram lá na estufa. Não sei por quanto tempo. Steaks de carne mecanicamente separada de aves que de tanto que comem não podem se assustar.