quinta-feira, 8 de janeiro de 2009


Um lugar é o que ele é para as pessoas que nele habitam, que o dotam de sentido e que dota a eles de sentido. Sentido pelas identidades que se constroem, pelas relações e pela história que existem no e em função do lugar. Lugar antropológico, que nos diz coisas, no qual somos quem somos e fazemos o que fazemos com os nossos pares.
Quando chegamos num lugar que não conhecemos, muitas nuanças percebemos, muitas nos escapam. Ver as pessoas, ver a vida que levam de acordo com os nexos que lhe são próprios, é um exercício grandioso de aprender com o mundo, o mundo dos outros, que nos faz refletir, questionar e reinventar o nosso mundo. Isso é a viagem profunda, se permitir tentar estar no “lugar” do outro. Enxergar o lugar pelos olhos dos que nele são a gente. Tentar pensar as coisas pelas ferramentas que são do outro, tentar identificá-las. Exercício de sensibilidade, de abertura, de malhação espiritual. Assim viajar é como ler um livro, mas um livro que corre sangue nas veias, que tem cheiros e cores.
Mas em geral não é assim na categoria “turismo” de nossa sociedade do hiper-consumo. Turismo de uma repetição exaustiva do eu num local bem aceito pela nossa moda construtora de identidades efêmeras. Fotos de eu, com vários fundos variados. Viagens que buscam EU, comprar um pacote é comprar uma tentativa de rechear sua alma, como se imagens fossem a matéria prima do espírito. Imagens fugidias e de pouca profundidade.
Um dinheiro gasto que ajuda a comunidade local, que gera empregos no verão, que pode aproximar estes desfavorecidos de nosso mundo dos fetiches fantásticos da alegria consumível. Mas e o lugar que você visitou, como era? O que ele é para quem nele vive, ou seja, quem é que vive lá, para além do motorista do barco, do garçon, e do sotaque que nos é simpático?
Vi um desfile de uma paulistanidade que busca recheio para sua alma e temas para sua estética. A transposição do nosso lugar para um pano de fundo diverso, a repetição de nossas vidas – patologias e trunfos – noutra paisagem. Transposição envernizada, que pouco se abre ao outro e que busca apenas nas relações de consumo adornar sua alma com itens exóticos.

Nenhum comentário: